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Entrevista com Igor Larionov II – parte 2

Entrevista

Entrevista com Igor Larionov II – parte 2

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Entrevista com Igor Larionov II
English version available here.

(Texto com co-autoria de Marina Garcez)

O NHeLas conversou com Igor Larionov II sobre sua trajetória no esporte, sua presença nas redes e muito mais. Além desta entrevista, você também pode assistir ao vídeo dele respondendo perguntas do Twitter aqui. Confira também ele fazendo um quiz em nosso site aqui.

(Esta entrevista foi editada para fins de brevidade e clareza. Parte 1 | Parte 3)

Você tem sido bem ativo em prol de direitos humanos no Twitter, de diferentes maneiras. O que te motivou a ser uma pessoa tão aberta nas mídias sociais, esse compromisso de empoderar e defender minorias e criticar o que entendemos como “cultura do hockey”?

Para mim, é bom senso. Não acho correto marginalizar as pessoas porque você acha que elas são diferentes de você. Eu não cresci com isso na minha família. Não fazíamos esse tipo de coisa e sempre me ensinaram que você precisa respeitar as pessoas e não tratá-las de maneira diferente porque não se parecem com você ou porque não vivem um estilo de vida semelhante ao seu, acho que isso é completamente errado. Então, quando as pessoas me chamam de ativista ou algo assim, não acho que sou um ativista. Só acho que sou alguém que usa o bom senso quando digo essas coisas. Porque, no final, não é certo odiar alguém porque esse alguém é um pouco diferente de você. Quer dizer, para mim, isso me deixa louco às vezes, eu fico sem palavras. Não consigo nem assimilar. Como faz sentido você não gostar de alguém só porque é diferente de você? Na realidade, isso é no mínimo um tesouro. Se todos no mundo fossem iguais, o mundo seria tão chato. É literalmente lindo que haja tantas pessoas diferentes lá fora, você pode falar com tanta gente diferente, aprender sobre suas experiências humanas, e há possibilidades infinitas de tantas conexões e caminhos lindos na vida em que, se eu disser algo no Twitter, não é porque quero ser como Greta Thunberg e ter um discurso que o mundo inteiro ouça. Não, eu só digo isso porque estou realmente perplexo com a forma como algumas pessoas escolhem odiar em vez de amar e, para mim, isso não está certo.

Mas se as pessoas tomam isso como ativismo, então fico feliz quando recebo essas mensagens de volta e as pessoas dizem “obrigado por se manifestar, eu me sinto visto.” E isso é algo lindo, porque eu sinto que vários atletas se limitam aos esportes. Mas os grandes, as pessoas que são lembradas ao longo da história são as que fizeram uma diferença maior, fora de quadra, do que você fazia quando eles estavam jogando. E isso é algo que eu acho muito importante porque se você tem uma plataforma e você tem um nome ou seguidores ou qualquer coisa, mesmo que seja apenas de boa intenção, e não que você queira ser um ativista ou algo assim, eu ainda acho que você deve buscar isso. Tenho recebido tantas mensagens de pessoas agradecendo e isso realmente aquece meu coração, porque para eu digitar algo, é muito fácil e não demora nada. Mas para eles, significa muito. Eu acho que é lindo e é algo que meu pai uma vez me disse, é um pouco diferente, mas meio que tem a mesma mensagem. Ele disse, “sempre que uma criança ou um fã pede uma foto, ou um autógrafo, aquele momento é um segundo para você, mas dura a vida inteira para eles.” Então é por isso que acho muito importante dispor a todos o seu tempo e, se você vir alguém marginalizado e sendo odiado por ser quem é, isso está errado, e eu não posso suportar isso.

Você mencionou como gosta de usar sua plataforma para promover direitos humanos no geral. Você gostaria de fazer algo relacionado a isso no futuro, talvez criar uma fundação, isso é algo que te interessa?

Honestamente, eu nunca pensei muito sobre isso. Mas pensando nisso agora, se eu pudesse fazer algo para ajudar as pessoas, definitivamente estaria aberto para isso, porque no final, é ótimo ser um bom jogador, mas se você realmente não ajudar ninguém, qual o sentido de chegar onde você está? Então, eu adoraria fazer algo como uma organização sem fins lucrativos ou uma instituição de caridade, ou apenas ter clínicas de hockey onde você pode ajudar pessoas assim ou expandir e desenvolver o esporte. Não tenho planos concretos para isso no momento, mas agora que você mencionou, é definitivamente algo que tenho interesse em fazer no futuro.

Alguma vez você imediatamente chamou a atenção de um companheiro de equipe por algo que você não considerava correto, como usar uma palavra ofensiva ou ter um comportamento misógino?

Normalmente, isso é muito difícil no vestiário, porque se você disser algo na hora, você se torna o inimigo e eles não vão te ouvir. Então é melhor ir com calma até alguém e dizer algo como “ei, cara, eu realmente não gosto do jeito que você está falando porque isso pode ser interpretado da maneira errada, e você pode realmente ofender alguém.” Isso aconteceu algumas vezes este ano, mas foi principalmente com os russos, que ouviram essas palavras em inglês e não sabiam o que queria dizer. Eles estavam apenas repetindo. É como quando você ouve uma criança dizer um palavrão, ela não sabe o que significa. Ela só está dizendo isso porque ouviu na TV ou porque ouviu a mãe e o pai dizerem. Aqui, houve algumas vezes que caras russos disseram alguma coisa que você simplesmente não ouviria em um vestiário norte-americano. Quando isso aconteceu, eu falei para ele “olha, cara, você realmente não pode sair falando coisas assim, porque isso não está certo. Eu entendo, você não sabe o que quer dizer. Eu entendo que em sua cultura é algo totalmente diferente. Mas se você vai falar inglês e tem aspirações de jogar na América do Norte, isso é algo que você tem que esquecer.”’ Houve outros momentos em que os caras tentaram me mostrar algumas coisas que eu simplesmente não achei certas e eu disse de cara “eu entendo que você quer me mostrar isso, mas não estou interessado” por exemplo, coisas relacionadas a mulheres ou qualquer coisa assim, eu simplesmente digo, “obrigado por oferecer, mas não, eu não estou interessado.” Então é assim que vejo as coisas.

Você já teve problemas por conta de algo que você disse ou fez que lhe parecia a coisa certa, mas que, como jogador de hockey, não era uma atitude esperada de você?

Eu nunca tive problemas de fato por falar nada porque eu sinto que sou bom com as minhas palavras, sei quando escolher minhas brigas. E em vestiários, eu realmente não me manifesto nesse quesito porque muitas vezes os caras se sentem ameaçados quando você faz isso. É melhor apenas, como eu disse, de um para um tocar discretamente no assunto. Mas uma vez, quando eu estava jogando na OHL, fiz uma celebração de curling, que na verdade é o tweet fixado no meu Twitter. E foi durante as Olimpíadas, eu marquei um gol, joguei minha luva no gelo e meu companheiro de equipe estava meio que varrendo. E depois disso fiquei no banco pelo resto do período, eu marquei no meu primeiro shift do jogo. No intervalo, o técnico vem até mim, na frente de todo o vestiário, começa a gritar, “como você pode fazer isso? Você é uma vergonha para o jogo, você não pode agir assim, blá, blá, blá.” Ele disse ao meu outro companheiro de equipe “vou mandar você de volta para a Rússia” (risos) você sabe, todas essas coisas. E ele não me colocou muito para jogar no segundo período, daí ficamos atrás no placar, acho que 3-1. Ele me colocou de volta no gelo, acabei conseguindo mais duas assistências. Eu fui a primeira estrela deste jogo. Depois, eles me disseram “vamos falar com você amanhã. Isso não está certo. Sabe, você não está livre porque jogou bem,” e eu pensando “o jogo é para ser divertido.” (risos) No dia seguinte, eu apareço e, da noite para o dia, aquele vídeo viralizou. Passou na ESPN, na TSN. Quase todas as grandes emissoras esportivas, em todos os países que passam hockey.

Inclusive no Brasil. (risos)

Sério? É, então acho que realmente rodou o mundo. E nosso próximo jogo, no dia seguinte, acabou esgotando porque tantas pessoas viram o vídeo e compraram ingressos, foi nosso primeiro jogo esgotado em um ano e meio, eu acho. A partir daí, ninguém mais disse nada para mim. Um dos meus treinadores disse “de onde você tirou isso?” Eu disse, “ah, eu vi um time da NFL fazer.” Ele disse “é, bem, nós não somos a NFL.” E eu disse “sim, eu sei, nós ganhamos muito menos dinheiro e muito menos pessoas nos assistem.” (risos) Então eu disse algo assim, e ele não concordou, nem discordou muito, só balançou a cabeça e foi embora. Foi isso, e ninguém nunca mais tocou no assunto. Então foi interessante, foi divertido para mim e muitos caras gostaram. Muitas pessoas gostaram se isso apareceu em tantas plataformas.

É engraçado, olhamos para a história dos esportes nos Estados Unidos e do futebol americano, beisebol, depois do basquete, todos eles tiveram aquele momento na história em que começaram a se promover de fato, e você vê o quanto o esporte cresce por causa disso. E enquanto isso, o hockey segue ali.

Exatamente. Eu sempre trago esse exemplo: a NBA e a NHL não eram tão grandes nos anos 80. E suas duas maiores estrelas começaram a jogar ao mesmo tempo, Wayne Gretzky e Michael Jordan. Eles praticamente começaram na mesma geração. Veja o que Michael Jordan fez com o basquete e o que Gretzky fez com o hockey. O basquete está em todo o mundo, enquanto o hockey, ele cresceu. Não vou dizer que não cresceu. Mas não cresceu tanto quanto o basquete. Você olha para um time como o PSG, que tem o logotipo do Jordan em sua camisa, um time de futebol tem a marca do Jordan, enquanto o hockey ainda é apenas hockey. Ele não atingiu de fato o cenário internacional como o basquete, por conta do que Michael Jordan foi capaz de realizar na quadra, mas também fora dela. Ele fez muito.

Você se preocupa, ao se pronunciar tão abertamente sobre algumas questões, que isso possa impactar suas chances de chegar à NHL?

Obviamente, isso passa pela minha cabeça. Eles realmente não gostam quando as pessoas se manifestam. Mas, ao mesmo tempo, o que eles não percebem é que, se você olhar para mim, como mencionei, eu tive mais pontos do que muitos caras que estão jogando na NHL agora nesta temporada e em muito menos jogos. É claro que posso jogar nesse nível se meus colegas e contrapartes podem fazê-lo. Mas uma coisa que eles não podem fazer é se você olhar minhas redes sociais, eu tenho muito mais seguidores em todas as minhas plataformas do que, eu diria, a maioria dos jogadores da NHL, e se eu fosse capaz de chegar a esse palco da NHL, eu seria capaz de ganhar muito dinheiro para uma equipe apenas com base nos patrocínios fora do gelo, todas essas coisas diferentes.

Apenas me coloque na frente de uma câmera e me deixe ser eu mesmo e eu posso literalmente ajudar uma equipe a ganhar muito dinheiro e aumentar sua receita. E se eles entendessem isso, sinto que definitivamente poderia ser algo a me ajudar. Eu acho que um monte de times, por exemplo, você olha para o Lakers, Kyle Kuzma, ele é um jogador mediano. Ele não é uma superestrela. Mas ele traz tantos fãs só com seu jeito de vestir, como ele se veste, sua aura, seu estilo de vida. O mesmo para o Manchester United, eles tinham um jogador chamado Jesse Lingard que não jogou por quase 16 meses, mas ele fazia uma comemoraçãozinha com as mãos, ele tinha produtos com sua marca, movimentos de dança, ele tinha todas essas coisas, e ele tem mais seguidores do que qualquer time da NHL. Ele faz muito dinheiro para o clube porque suas camisas sempre estão entre as mais vendidas, seus produtos são sempre uns dos mais vendidos, mas também sua atividade no Instagram e suas redes sociais atraem tantos fãs de todo o mundo. E eu posso fazer algo assim por qualquer time, mas também quando você olha para esses jovens da minha idade e eles produzem menos do que eu, eu posso produzir no mesmo nível, senão melhor do que esses caras. E eu ainda sou jovem, então com o tempo só posso melhorar todos esses fatores.

Se eu fosse um time da NHL, eu veria um cara como eu e pensaria “certo, então temos um jogador jovem potencialmente bom que foi capaz de jogar na segunda melhor liga do mundo nessa idade, mas ele também tem um grande número de seguidores, de modo que se o trouxermos e o promovermos, nem precisa ser muito, apenas promovê-lo de leve, ele pode crescer a ponto de se tornar alguém que atrai novos fãs e novos públicos, e nos traz muito dinheiro.” Porque no final das contas é com isso que a maioria das equipes se preocupa, ganhar dinheiro. Portanto, acho que qualquer equipe da NHL só teria a ganhar, e eu ficaria feliz em agarrar qualquer oportunidade, porque obviamente sei que posso jogar neste nível e tenho confiança de que posso fazer tanto o trabalho no gelo quanto fora dele, e eu adoraria fazer isso para qualquer equipe.

Não é tão difícil, NHL, vamos lá. É o melhor esporte do mundo e ainda consegue ser tão frustrante às vezes.

Exatamente. É o que eu sempre digo, o hockey é o único esporte em que o melhor produto é de fato o jogo. Você olha para qualquer outro esporte, olha para a NBA, são as brincadeiras fora das quadras. São os jogos em que os ex-namorados de Kylie Jenner estão jogando um contra o outro que têm mais visualizações. Enquanto que aqui, o melhor do nosso esporte é o que está acontecendo no próprio gelo. Todo o resto é incomparável. Você não pode nem compará-lo ao golfe, ou a qualquer outra coisa. É muito pior do que qualquer outro esporte, e isso está prejudicando muito, muito a liga. Mais pessoas merecem assistir ao hockey, mas nunca terão a chance porque não é divertido o suficiente. Não há drama. É basicamente isso.

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